Da desconfiança às surpresas positivas: a evolução do cenário em 2023

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Em estudo exclusivo, a Órama acompanha desde abril as projeções dos gestores para os principais indicadores econômicos. Confira a análise desses resultados e a visão do time de Estratégia.

Visão geral

O ano de 2023 começou com muitas perguntas: no terceiro mandato de Lula, o mercado se questionava principalmente como seria a condução das pautas econômicas. Com um partido de esquerda ocupando a presidência, sem uma base sólida no Congresso, no início reinava uma desconfiança tanto da disposição quanto da capacidade do governo para avançar temas relevantes como o Arcabouço Fiscal e a Reforma Tributária.  

A grata surpresa política para o mercado foi a performance de Fernando Haddad como Ministro da Fazenda. Sob o lema de buscar o equilíbrio entre responsabilidade fiscal e social, o Arcabouço foi apresentado no dia 18 de abril. Em um pouco mais quatro meses, o PLP 93/2023 já estava sancionado pelo presidente. Mesmo com reconhecidos desafios, a nova regra fiscal traz como inovação a combinação de um limite para o crescimento das despesas vinculado à uma meta de resultado primário. O cumprimento das regras do jogo e, eventualmente, das penalidades estabelecidas para o caso do estouro do limite de déficit são as peças-chave para a credibilidade fiscal do governo no próximo ano.  

Ainda na pauta econômica, a Reforma Tributária (PEC 45/2019) também andou. Sob muita pressão política e uma complexidade inerente ao tema, a Câmara aprovou o texto no dia 06 de julho. No Senado, a PEC modificada foi votada no dia 09 de novembro e dado que foram incluídos novos parágrafos, a proposta precisa ser analisada novamente na Câmara. Como o próprio Haddad mencionou, a reforma dos tributos indiretos merece nota 7 ou 7,5, mas como o atual sistema receberia uma nota 2, o saldo nos parece positivo.  

Outra pergunta que o mercado se fazia é quem seriam os nomes indicados por Lula para as vagas no Banco Central, visto que em janeiro já começaram ataques do chefe do Executivo à autoridade monetária. Até o momento, as indicações não desagradaram nem animaram. Em julho, Gabriel Galípolo e Ailton Aquino tomaram posse, e o que podemos observar é uma continuidade na conduta do Copom que manteve uma postura de cautela nesse início do processo de normalização da Taxa Selic. Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira, já indicados, ainda precisam ser sabatinados pelo Senado para assumirem seus postos. A possibilidade de interferência política no BC talvez seja a desconfiança que vai continuar acompanhando o governo até o fim de 2024, quando termina o mandato de Roberto Campos Neto.

Do lado internacional, o nível dos juros era a principal incerteza. Nos EUA, de acordo com a ferramenta de expectativas da CME, as expectativas em janeiro apontavam que o ciclo de alta terminaria na faixa de 4,75%-5,00%, com o início do afrouxamento da política monetária no último trimestre de 2023. Todavia, ao decorrer do ano, com desafios fiscais, persistência inflacionária, novos conflitos mundiais vimos os rendimentos dos títulos do tesouro atingirem máximas históricas. Com isso, o mercado revisou suas estimativas. Hoje, os juros americanos estão em 5,25%-5,50%, com a porta ainda aberta nas comunicações oficiais para elevações adicionais, apesar de improvável na visão do mercado. O patamar dos juros nos EUA tem impacto relevante sobre os preços dos ativos globalmente e essa volatilidade incomum marcou o ano que se encerra e deixa a incerteza sobre a trajetória como um desafio para 2024.

Reconhecendo que as expectativas para indicadores de mercado eram dependentes do desenrolar dessas incertezas, decidimos que seria interessante acompanhar essa evolução do cenário aproveitando a entrada que a Órama tem como distribuidora de fundos de investimento. Em abril passamos a fazer um levantamento mensal com os gestores para acompanhar as projeções para IPCA, Taxa Selic, PIB e Ibovespa para o fim de 2023 pela ótica de quem está operando no dia a dia. Em novembro acrescentamos no formulário a pergunta sobre as projeções para as mesmas variáveis para o fim de 2024, que será tópico do próximo texto.

Os resultados dessa pesquisa foram consolidados em gráficos de frequência que ilustram essa mudança nas perspectivas ao longo do ano. 

É interessante notar que desde de abril, vemos uma melhora considerável do cenário das projeções, com revisões consecutivas do crescimento da atividade para cima, e da inflação para baixo. Em relação à taxa Selic, há uma convergência significativa para o patamar de 11,75% a.a. em comparação com o início do estudo. E por fim, as projeções para bolsa são as mais difusas indicando ainda a complexidade de vetores influenciando o Ibovespa.

Confira a evolução das projeções para cada indicador: 

Juros:

Olhando para o gráfico 1, podemos observar um crescimento gradual do consenso em relação às expectativas para a taxa Selic no fim de 2023.

Em abril, podem ser identificados três picos distintos com frequências próximas: 

  • 25% dos gestores apostavam que a Selic permaneceria até o fim do ano em 13,75% a.a.; 
  • 17,86% acreditavam que o BC recuaria os juros para 12,75% a.a.;
  • 21,43% dos respondentes, inclusive a Órama, viam que a política monetária fecharia 2023 em 12% a.a.

Gráfico 1:

De um cenário muito incerto no primeiro trimestre do ano, chegamos em novembro, faltando apenas uma reunião do COPOM, com 83%, das casas com as apostas que a Selic chegue a 11,75% a.a.

A manutenção da meta de inflação em 3% com a adoção de uma meta contínua, em junho, contribuiu para a redução das expectativas de inflação para 2026, que recuaram de 4% em abril para 3,5% de acordo com o último Focus de novembro. Esse processo de ancoragem ainda não está completo, mas é uma sinalização positiva para o trabalho do Banco Central.

Além disso, o avanço da agenda econômica também ajudou a reduzir os prêmios de risco que estavam embutidos nas expectativas de inflação e juros de longo prazo. 

Contudo, o movimento de convergência das projeções foi intensificado a partir de agosto, podendo ser explicado pela comunicação do Banco Central após o primeiro corte (02/08), que antecipou que os próximos também seriam na mesma magnitude (50 bps) e adicionou os possíveis fatores que poderiam intensificar essa redução da taxa básica. 

Analisamos também as respostas considerando um filtro das gestoras com mais de R$3 bilhões sob gestão. A ideia era identificar se casas maiores, e que fazem mais preço no mercado, teriam projeções distintas, ou não, da mediana geral. Notamos que de uma diferença inicial de 25 bps nos dois primeiros levantamentos, a partir de julho, as medianas dos grupos passam a coincidir. 

Gráfico 2:

Número de respostas em novembro: 60

Inflação:

Observamos uma redução maior do que 1 p.p. nas projeções de inflação desde abril, No início do estudo, 60% das respostas apontavam que a inflação para o fim de 2023 ficaria entre 6-6,5%. Em novembro, 67% das casas projetam que o IPCA feche entre 4,5-5%. 

Gráfico 3: 

Essas revisões ao longo do ano podem ser explicadas pelas aberturas mais favoráveis no índice, principalmente nos serviços, um dos focos do Banco Central na busca pela meta de inflação. Além disso, os cortes no preço da gasolina em maio, junho e outubro contribuíram para a redução das projeções. 

No caso da inflação, notamos uma diferença marginal da mediana geral para a mediana das projeções de casas com mais de R$3 bi em ativos sob gestão. Calibragens nos números se fazem necessárias frente aos novos dados que corroboram com uma trajetória desinflacionária positiva.Além disso, a aproximação com o fim do ano abre menos espaços para mudanças mais bruscas nas projeções, visto os dados já realizados.

Gráfico 4:

Número de respostas em novembro : 57

Atividade econômica:

As projeções para o crescimento do PIB em 2023 tiveram um salto de 2 p.p. desde os primeiros dados da pesquisa em abril. A maior parte da revisão se deu após a surpresa positiva do agronegócio no primeiro trimestre, que cresceu 21%, tendo uma contribuição de cerca de 1,7 p.p. sobre o resultado. O PIB do segundo trimestre, divulgado no início de setembro, também trouxe uma atividade mais resiliente do que era antecipado (avanço de 0,9%, acima da projeção do mercado (0,3%) e da Órama (-0,4%)), principalmente no Agro (-0,9%) e nos Serviços (0,4%), contribuindo para a revisão altista das projeções. 

Gráfico 5:

Mesmo com uma Selic extremamente restritiva desde o ano passado, houve surpresas também em relação à resiliência do mercado de trabalho, que registra a menor taxa de desemprego desde 2014.

A maior difusão entre as respostas em junho pode ser explicada pelo PIB do primeiro trimestre divulgado no início do mês (01/06), tendo algumas casas já incorporado a revisão no número enviado, enquanto outras não.

Para as projeções de atividade econômica, também não vemos diferenças significativas entre as medianas segmentadas por AuM. Vale destacar novamente o viés altista das revisões. 

Gráfico 6:

Número de respostas em novembro: 68

Bolsa:

De todos os indicadores, a visão em relação ao Ibovespa ao fim de 2023 é a menos homogênea. Isso pode se dar pela diferença de interpretação sobre o impacto do cenário doméstico e internacional sobre as ações brasileiras, uma vez que a conjuntura ainda é muito incerta. Identificamos alguns pontos cujas leituras distintas impactariam no resultado final do índice. São eles:

  • intensidade do conflito entre Rússia e Ucrânia;
  • resiliência da atividade doméstica;
  • avanço no Congresso da pauta econômica;
  • capacidade do governo de entregar o resultado primário em 2024 e suas consequências;
  • desaceleração da economia chinesa;
  • ritmo de aperto da política monetária americana e resiliência da atividade econômica;
  • impactos nos preços das commodities em função do conflito no Oriente Médio

Gráfico 7:

Novembro foi o primeiro mês em que vimos uma maioria mais clara para o Ibovespa ao fim de 2023. Com 67% das respostas apontando para patamar entre 121-130 mil pontos, é interessante notar que a assimetria da distribuição é baixista: ou seja, não há quem aposte num nível acima de 130 mil pontos, ao passo que ⅓ das casas acreditam que o principal índice de ações do Brasil pode terminar o ano abaixo dos 120 mil pontos.

Na segmentação por AuM vemos um comportamento distinto entre a média geral e o segmento com mais de R$3 bi sob gestão nos meses de agosto e outubro. As gestoras maiores, em agosto, estavam mais otimistas com a bolsa que é mediana geral. Mas, por outro lado, em outubro estavam mais pessimistas. 

De qualquer forma, o salto do patamar de 111-120 mil pontos para 121-130 mil pontos talvez possa ser por uma perspectiva mais construtiva em relação à pauta econômica, além de uma Selic consideravelmente mais baixa, na comparação com as expectativas de abril. 

Gráfico 8:

Número de respostas em novembro: 42

IPCA

4,5%

PIB

3,0%

SELIC

11,75%

DÓLAR*

R$ 5,00 a 5,10

IBOVESPA

125 mil pontos

Confira os relatórios específicos para cada um desses indicadores em PROJEÇÕES MACRO.

De fato, 2023 trouxe bastante volatilidade para os mercados e rumando para o fim do ano vemos que, no início, imaginávamos um cenário pior do que o concretizado. Essas alterações de perspectiva são naturais frente aos novos acontecimentos e por isso, um acompanhamento profissional constante se faz mais necessário que nunca para que os investidores consigam capturar as melhores oportunidades. Justamente em momentos de cenário indefinido, temos assimetrias de preços que propicia alocações táticas para maximizar os retornos compostos dos investimentos. 

É com esse olhar que continuamos nosso trabalho e no próximo texto, traremos quais são as perspectivas e os desafios para o ano de 2024.


Para acesso à metodoloria do estudo, clique aqui:

"Este material foi elaborado pela Órama DTVM S.A.. Este material não é uma recomendação e não pode ser considerado como tal. Recomendamos o preenchimento do seu perfil de investidor antes da realização de investimentos, bem como que entre em contato com seu assessor para orientação com base em suas características e objetivos pessoais. Investimentos nos mercados financeiros e de capitais estão sujeitos a riscos de perda superior ao valor total do capital investido. Este material tem propósito meramente informativo. A Órama não se responsabiliza por decisões de investimentos que venham a ser tomadas com base nas informações aqui divulgadas. As informações deste material estão atualizadas até 25/11/2023."


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