O substitutivo do Novo Arcabouço Fiscal: “Regime Fiscal Sustentável”

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O SUBSTITUTIVO DO NOVO ARCABOUÇO FISCAL

Hoje (16/05), o deputado Claudio Cajado (PP-BA) apresentou o relatório preliminar substitutivo ao projeto do novo arcabouço fiscal (PLP 93/23), renomeado para Regime Fiscal Sustentável, que vai suceder o teto de gastos. 

O texto mantém o cerne do projeto do governo (despesa atrelada à variação da receita e meta de resultado primário), mas o relator propõe algumas mudanças. Ele limita as exceções à regra, corrige o descasamento do IPCA para a apuração das receitas e das despesas e principalmente, estabelece o contingenciamento obrigatório e o acionamento de gatilhos para conter o avanço das despesas

Após um acordo político, ficou preservado o aumento real do salário mínimo fora do limite das regras, mas o programa Bolsa Família será tratado como qualquer outra despesa obrigatória.

A REGRA

Como mencionado, foram mantidos os dois pilares originais do Regime Fiscal Sustentável: 

  1. a limitação do crescimento da despesa a um percentual (70% ou 50%) da variação da receita (com limites mínimo e máximo) 
  2. a observância do cumprimento do resultado primário (dentro de uma banda) como um critério para o percentual de reajuste que a despesa terá no ano seguinte

A meta de resultado primário tem um centro, estabelecido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), mas pode flutuar ao redor dessa meta entre – 0,25% a +0,25% do crescimento real do PIB do ano anterior. Na LDO para 2024, ainda não votada no Congresso, as metas para 2024, 2025 e 2026 serão, respectivamente, 0,0%, 0,5% e 1,0% do PIB.

Isso significa que caso o resultado primário fique dentro da banda, as despesas poderão crescer de forma real 70% do crescimento da receita, também descontado da inflação. Caso contrário, o incremento da receita fica limitado a 50% do aumento das receitas. Essa relação pode ser observada nos gráficos abaixo:

AS MUDANÇAS

De forma geral, as mudanças propostas pelo relator Cláudio Cajado melhoram o texto.

O ponto central do substitutivo foi a inclusão de gatilhos de contingenciamento, além de uma gradação das sanções no caso de reincidência do descumprimento das metas de superávit primário.

De acordo com a nova redação, o governo vai avaliar a cada bimestre o comportamento das receitas e das despesas, como já acontece hoje. Se o cumprimento da meta fiscal do ano estiver em risco, o executivo  terá que contingenciar os gastos discricionários. Se ainda assim houver descumprimento da meta fiscal ao final do ano, medidas de ajuste serão acionadas no ano seguinte, de forma gradual.

No primeiro ano, o governo não poderá criar cargos, novas despesas obrigatórias ou ampliar incentivos. Além disso, a despesa só crescerá 50% da variação real da receita do ano anterior. As penalidades valem por um ano. Se no ano seguinte a meta for atingida, elas deixam de valer. Mas se não for, voltam mais duras no segundo ano, com novas vedações, como concessão de reajuste ao funcionalismo público

As mesmas proibições serão aplicadas se as despesas obrigatórias ultrapassarem 95% das despesas primárias.

O presidente da República ainda poderá enviar ao Congresso projeto de lei complementar propondo a suspensão ou gradação das medidas de ajuste, desde que demonstre que vai compensar o desvio apurado na meta.

Em relação aos pedidos do governo, no  § 3º, do artigo 6º o relator fez um aceno a Lula explicitando que a aplicação das medidas de ajuste não se aplica aos reajustes do salário mínimo decorrentes das diretrizes instituídas em lei de valorização do salário mínimo.

Contudo, o Bolsa Família não foi blindado como se especulou nos últimos dias. O Bolsa Família, como qualquer outra despesa obrigatória, já não pode ser contingenciada. Se o governo quiser insistir em reajustar o programa acima da inflação, mesmo com as contas públicas fora da meta, poderá propor ao Congresso Nacional um projeto de lei complementar informando qual medida compensatória irá adotar para promover economia semelhante ao gasto produzido com o reajuste do benefício.

O relator também enxugou a lista das despesas excluídas dos limites da regra. Das 13 propostas pelo governo, ficaram nove. Voltam para o limite as despesas com o piso nacional da enfermagem, o aumento de capital das estatais, a complementação ao Fundeb e Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF).

Além disso, de acordo com a proposta do substitutivo, sempre que houver superávit primário acima do valor superior da banda da meta, 70% do equivalente a esse superávit será exclusivamente destinado a investimentos, desde que não ultrapasse 0,25% do total do PIB.

Um outro ponto que havíamos salientado como problemático no texto original do PLP diz respeito ao uso de critérios diferentes para apurar a inflação para fazer as contas do crescimento real das receitas e o IPCA  que vai corrigir as despesas. Essa discrepância foi corrigida e será usado de forma uniforme o período de doze meses encerrado em junho do exercício anterior ao que se refere a lei orçamentária. Se houver diferença entre o IPCA efetivo do fim do ano e a inflação que irá corrigir as despesas, essa diferença poderá ser utilizada para ampliar o limite autorizado para o Poder Executivo na Lei Orçamentária Anual, por meio de crédito, quando necessário à suplementação de despesas. Essa ampliação que não se incorpora na base de cálculo dos exercícios seguintes.

Não foi incluída a criminalização do presidente da República em caso de descumprimento da regra. Contudo, o relator afirmou que o fato de no parecer não constar menção ao crime de responsabilidade fiscal, isso não significa que ele não existe. Segundo Cajado, o PLP e a Lei de Responsabilidade Fiscal são diferentes e uma não anula a outra.

A REPERCUSSÃO

O Ministério da Fazenda avalia que o relatório do arcabouço fiscal “está dentro do esperado”. 

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou nesta terça-feira (16) que está otimista com o andamento da proposta e, tão logo a matéria seja aprovada pela Casa vizinha, o Senado irá se debruçar sobre o tema para garantir uma conclusão rápida.

O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), também comentou que há uma orientação do governo para que o texto seja votado sem a apresentação de emendas e destaques.

O mercado financeiro, por sua vez, de forma geral, apesar de reconhecer as melhorias, aponta que os desafios para a implementação continuam. Ainda é preciso um aumento expressivo das receitas, caso contrário, a sustentabilidade da trajetória da dívida pública fica comprometida. Como já vínhamos em uma sequência de oito pregões de alta do Ibovespa, e cinco de queda do dólar, o dia foi de alta volatilidade, com a realização dos ganhos recentes impulsionada pela divulgação de balanços corporativos piores que o antecipado pelos analistas. 

No mercado de juros, os DIs subiram de forma leve, também destacando que do dia 09 de maio até o fechamento de ontem (15), a taxa do contrato futuro de DI para janeiro de 2033 havia recuado 77 bps para 11,71%. Da máxima do ano de 13,83% no dia 02 de março, o fechamento da curva já foi mais de 200 bps.

OS PRÓXIMOS PASSOS

Junto com o texto substitutivo, foi encaminhado o REQ n. 1537/2023 (Requerimento de Urgência (Art. 155 do RICD)), pelo Deputado José Guimarães (PT/CE -Fdr PT-PCdoB-PV) e outros.

Um projeto em regime de urgência pode ser votado rapidamente no Plenário, sem necessidade de passar pelas comissões. 

A expectativa é que na quarta-feira (17) o Plenário da Câmara dos Deputados (Casa iniciadora) vote esse requerimento. Essa urgência não deve ter dificuldades em ser aprovada uma vez que depende do acordo de líderes que já se mostraram favoráveis à aceleração desse processo. 

Os projetos de lei complementar exigem um quórum diferenciado para a sua aprovação, que é, no mínimo, a maioria absoluta de votos, ou seja, 257 votos na Câmara. Na próxima semana, no dia 24 de maio, está prevista a votação do mérito do texto.

Após a tramitação na Câmara (Casa iniciadora), o texto vai para o Senado Federal (Casa revisora) onde segue os mesmos ritos. No Senado, o texto precisa de no mínimo 41 votos favoráveis. Qualquer alteração nesse estágio faz com que o texto volte para a Câmara. A Casa onde o projeto se iniciou (Câmara) dá a palavra final sobre seu conteúdo, podendo aceitar ou não as alterações feitas no Senado.

Os projetos de lei complementar aprovados nas duas Casas são enviados ao presidente da República para sanção. O presidente tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar, total ou parcialmente. Todos os vetos têm de ser votados pelo Congresso. Para rejeitar um veto, é preciso o voto da maioria absoluta de deputados (257) e senadores (41).

CONCLUSÕES

Sem dúvidas o texto substitutivo trouxe melhorias para o novo Arcabouço Fiscal. A principal delas é a introdução de gatilhos para o contingenciamento, além da progressão das sanções no caso de reincidência do descumprimento da meta de resultado primário. 

A tramitação na Câmara deverá ser em regime de urgência, com o requerimento sendo aprovado amanhã (17) e a votação do mérito é esperada para a próxima semana. No Senado, o processo também deverá ocorrer de forma célere. 

Dada a importância do tema e os pronunciamentos favoráveis dos presidentes das Casas, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, assim como da oposição e da base aliada, vemos uma probabilidade muito grande de esse texto ser aprovado no Legislativo ainda no primeiro semestre.

Alexandre Espírito Santo – Economista-Chefe 
Lorena Laudares – Mestre em Ciência Política
Eduarda Schmidt – Analista de Macroeconomia

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